Novos paradigmas para a drenagem nos municípios Elzio Mistrelo (*)

Novos paradigmas para a drenagem nos municípios Elzio Mistrelo (*)

As implicações da tragédia no Rio Grande do Sul são devastadoras e com  potencial de se repetir naquela e em outras regiões do país, ainda com maior frequência diante do fenômeno das mudanças climáticas.  O caos enfrentado pelos gaúchos reforça a necessidade de um novo olhar para os sistemas de drenagem e manejo de água pluviais urbanas (DMAPU). Um dos principais fatores para a possibilidade de repetição de catástrofes está no desenvolvimento urbano desordenado do país, a partir da década de 1960. A ocupação desenfreada ampliou significativamente a impermeabilização do solo, com maior intensidade nas regiões metropolitanas. Esse movimento de ocupação continua ocorrendo na periferia das grandes cidades, afetando áreas de mananciais e aumentando os riscos de inundações e de desmoronamentos de encostas.

Até então, a infraestrutura de drenagem e macrodrenagem para enfrentar as chuvas têm adotado padrões desconsiderando os novos desafios climáticos. Os tradicionais modelos utilizados pelas cidades brasileiras são compostos por sistemas de escoamento utilizando estruturas destinadas a conduzir as águas aos canais, planícies e rios. Com isso, aumentam as possibilidades de inundações.

O fenômeno das mudanças climáticas amplia a necessidade de uma visão integrada no planejamento urbano. As soluções passam por permitir novos espaços para o escoamento das águas. O caminho a ser seguido precisa reduzir os impactos das intervenções humanas no meio ambiente por meio de soluções sustentáveis ao longo prazo. A tradicional ocupação do solo precisa ser transformada e integrar o máximo possível a maneira como a natureza age para reduzir o impacto dessas chuvas. O uso de piscinões e outros sistemas para evitar enchentes já não é suficiente diante do tamanho do problema que temos pela frente.

O planejamento urbano integrado com iniciativas sustentáveis parece ser o caminho a ser seguido pelas cidades. Diante de uma ocupação tão intensa, é impossível soluções de curto prazo, mas é preciso apontar para as mudanças e buscar realizá-las no médio e longo prazo como forma de garantir qualidade de vida para a população dessas localidades afetadas pelas chuvas.

Os gestores públicos e equipes técnicas têm a tarefa de compreender a complexidade do novo modelo que se busca aplicar nas cidades, que precisam alcançar o maior equilíbrio possível entre os ecossistemas naturais, o sistema urbano artificial e as mais variadas demandas da sociedade. O pesquisador Carlos Tucci propõe, por exemplo, um Plano Diretor de Drenagem Urbana baseado em novos sistemas que não podem aumentar a vazão máxima dos cursos d’água, e o planejamento e controle dos impactos existentes devem ser elaborados considerando a bacia como um todo. O Plano Diretor da cidade deve integrar o planejamento dos sistemas pluviais e o controle dos efluentes deve estar integrado ao esgotamento sanitário e aos resíduos sólidos.

As catástrofes recentes impõem um novo modelo de planejamento das cidades. Precisamos rever conceitos e preparar soluções para os novos paradigmas que temos pela frente. Precisamos colocar nas agendas das cidades um debate técnico amplo parara enfrentar os novos desafios. Caso contrário, teremos que conviver com a repetição frequente de tragédias.

(*) Elzio Mistrelo é engenheiro, Diretor Administrativo e Financeiro da Apecs (Associação Paulista de Empresas de Consultoria e Serviços em Saneamento e Meio Ambiente) e coordenador do Boletim do Saneamento.

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