Publicado em 20 abr 2022
Fonte: Instituto Água e Saneamento
Um dos destaques recorrentes sobre o novo Marco Legal do Saneamento foi o estabelecimento de prazos para a “universalização” de atendimento, para o ano de 2033, de 99% da população com acesso à água e 90% com acesso à coleta e tratamento de esgotamento sanitário – são apenas 13 anos para garantir que mais 36 milhões de brasileiros tenham acesso à água potável, assim como a coleta e tratamento do esgoto gerado por outros quase 100 milhões de pessoas.
É consenso que o saneamento é urgente no país, e prazos são importantes pois impactam no ritmo e na qualidade da implementação da política em todas as instâncias federativas. O prazo foi um argumento recorrente por diversos setores, para debates apressados nas AL dos estados sobre as novas leis de regionalização da gestão de saneamento, tidos em muitos casos como pouco transparentes e pouco debatidos com a sociedade.
Anteriormente, a Lei Federal já havia estabelecido o prazo de um ano após sua promulgação, 15/07/2021, para os estados aprovarem suas leis de regionalização. O decreto 10.588, de 24 de dezembro de 2020, estendeu o prazo com o entendimento de que a conclusão dos processos deveria se dar até o último dia 31 de março, mesma data em que as agências reguladoras deveriam apresentar suas conclusões sobre a capacidade econômicafinanceira dos contratos. Um dia depois, em 1° de abril de 2022, o Governo Federal editou um novo decreto (nº 11.030/2022) e, agora, os estados têm mais um ano para concluir os seus processos de regionalização da gestão do serviço de saneamento básico.
O prazo em si não é o problema – se adotado desde o início, o processo poderia ganhar maior transparência e participação social, favorecendo soluções inovadoras e efetivas. Mudanças nos prazos previstos na Lei 14.026/2020 remetem ao distanciamento entre as expectativas trazidas pela Lei e a realidade de sua implementação. Tais atropelos despertam um clima de incerteza pois podem ser constantemente “alterados”, ou reinterpretados, por decretos futuros.
Soma-se a este fato outras datas que não seguiram os pressupostos da lei, como o decreto de capacidade financeira, uma das principais diretrizes para regionalização, que foi publicado no final de maio, sete meses após o prazo previsto na Lei, e muito próximo do prazo para os estados aprovarem suas leis. A Regulação, outro eixo fundamental da lei, também foi postergado e as normas que deveriam ser editadas no biênio 21/22 foram redistribuídas até 2023, e tirou da pauta normativas importantes como a Emergência, Contingência, inclusive racionamento e sobre perdas de água na distribuição.
O principal condicionante, ou incentivo federal para o cumprimento do prazo é a possibilidade de acesso à recursos públicos federais, e com o adiamento, estados e municípios que ainda não iniciaram ou não concluíram seus processos de regionalização (seja por estarem tramitando nas assembléias legislativas, ou pela adesão dos municípios ainda não ter sido concluída) voltam a estar aptos, por mais um ano, a receber recursos públicos federais e financiamentos com recursos da União.
Com o novo prazo, ganham mais tempo: Minas Gerais para lidar com o Projeto de Lei que tramita há oito meses na Assembléia Legislativa, Mato Grosso que também está alterando o projeto de lei inicialmente enviado pelo executivo na casa legislativa, os estados que só agora iniciaram seus processos com ajuda federal (Pará, Tocantins, Mato Grosso do Sul e Acre) e São Paulo, que aprovou lei em julho de 2021 mas cujo prazo de adesão dos municípios às Unidades Regionais de Água e Esgoto venceu em janeiro deste ano e não há informações sobre como se deu essa adesão.
Está evidenciado no texto do decreto que a extensão do prazo não vale para os municípios que decidiram não aderir às estruturas regionalizadas (no caso dos arranjos em que a adesão é voluntária) e que tenham publicado edital de licitação para concessão de serviços de saneamento básico em âmbito municipal após a data de publicação da Lei nº 14.026, de 2020. Ou seja, esses ficaram sem acesso aos recursos federais.
O decreto reforça ainda que a proposta de regionalização, considerando os serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, deve incluir todo o território do estado. Nesse entendimento, estados como Rio de Janeiro e Mato Grosso do Sul, que fizeram concessões de prestação dos serviços parciais, envolvendo blocos de municípios, mas deixando outros de fora, não concluíram seus processos de regionalização.
O novo decreto regulamenta ainda outros pontos, prazos e novos condicionantes:
sobre os blocos de referência, modalidade de regionalização de competência da União;
sobre equalização de prazos de contratos em uma mesma região com vistas à concessão;
sobre o encerramento de contratos “irregulares” de empresas que não comprovaram sua capacidade econômico-financeira para atender às metas de universalização até 2033.
Enquanto a União não editar por ato do Poder Executivo Federal os blocos de referência para a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico, a partir de deliberação do Comitê Interministerial de Saneamento Básico – Cisb, os convênios de cooperação ou consórcios públicos (existentes ou novos), para serviços de abastecimento de água e de esgotamento sanitário, serão reconhecidos como blocos de referência, desde que atendidas concomitantemente as condições:
Essa alteração transforma em blocos de referência alguns dos convênios de cooperação assinados entre municípios e o estado resultantes de processos de concessão iniciados antes da aprovação do novo marco legal, como no Rio de Janeiro e Amapá. A concessão da região metropolitana de Maceió, ainda que realizada anterior à lei, já está contemplada na lei estadual de Alagoas, e por isso é considerada como Unidade Regional. No entanto ressalta-se que o decreto 10.588/2020, em sua redação original, já garantia o acesso a recursos federais para esses processos de concessão, em caráter de exceção.
Caso se opte por uma prestação regional por meio de uma nova concessão conjunta, os contratos vigentes firmados individualmente com cada município (desde que “regulares”) poderão ser “equalizados” (prorrogados ou reduzidos) para que a data de término seja igual para todos e coincida com a data de início da nova concessão. O decreto define que a data de convergência do término dos contratos regulares não seja posterior a três anos da assinatura dos respectivos aditivos de redução ou prorrogação.
Os titulares dos serviços públicos de saneamento (municípios e estados no caso de titularidade compartilhada) com contratos de prestação vigentes “irregulares” – com empresas que não conseguiram comprovar sua capacidade econômico financeira, de acordo com a metodologia exigida pelo MDR e pela análise das agências reguladoras – poderão, num período de transição, acessar recursos públicos federais ou financiamentos com recursos da União ou geridos ou operados por órgãos ou entidades da União para investimentos de capital, desde que sejam cumpridos um conjunto de condicionantes e datas:
As empresas que não passaram ou não apresentaram documentação sobre a capacidade econômico-financeira, ou não incluíram as metas de universalização até 31/03/2022- chamados pelo decreto como “contratos irregulares”, ou operação irregular não poderão receber recursos públicos federais. Desse modo, de acordo com o texto do decreto, cabe ao titular dos serviços públicos a imediata adoção de providências para transição para uma forma de operação regular. O que não significa a interrupção automática do serviço, mas um período de transição O que é importante destacar é que a extinção antecipada de um contrato significa o poder municipal arcar com o pagamento das indenizações cabíveis.
As alterações nos prazos da implementação do novo Marco Legal:
Acompanhe todos os prazos de implementação no Observatório do Marco Legal