No final de agosto, a Sabesp anunciou uma medida temporária de redução da pressão da água em toda a Região Metropolitana, das 21h às 5h. Segundo a empresa, a medida foi tomada considerando os baixos níveis dos mananciais e “visa a evitar perdas por vazamentos e rompimentos de tubulações, contribuindo para a manutenção dos níveis dos reservatórios do Sistema Integrado Metropolitano”.
Os mananciais da Região Metropolitana de São Paulo vêm registrando seus menores níveis dos últimos dez anos. Embora os dados não apresentem números tão ruins quanto os da crise hídrica de 2014-2015, a situação ainda merece nossa atenção. Medidas como a adotada pela Sabesp acendem um alerta sobre o que o futuro nos aguarda quando o assunto é água, principalmente nos grandes centros.
Num cenário de incerteza mediante a disponibilidade de recursos hídricos, o reúso aparece como uma opção a fontes alternativas de água
José Carlos Mierzwa, professor do Departamento de Engenharia Hidráulica e Ambiental da Escola Politécnica da USP, explica que embora existam estiagens, a precipitação — a quantidade de chuva que cai — se mantém numa média ao longo do tempo. Nas suas palavras, a maior questão sobre a falta de água recai no consumo:
“À medida que as pessoas começam a ter expansão da área urbana, as pessoas começam a ter acesso a produtos que geralmente elas não tinham antes. Inerentemente a melhoria da qualidade de vida das pessoas leva a um aumento do consumo de água”.
Tendo esse cenário de consumo cada vez maior, o professor explica que países como os Estados Unidos, Coreia, Austrália e África do Sul vêm buscando estratégias. Essas estratégias permitem um reúso mais eficiente da água.
“Países do exterior têm identificado formas alternativas de aumentar a oferta de água. Qual é essa forma? Melhorando as tecnologias de tratamento de esgoto, inclusive, alguns países hoje já fazem o que a gente chama de reúso potável”, completa.
Ciclo fechado e reúso potável A ideia do ciclo fechado é que, por meio de processos de purificação, o esgoto seja tratado e essa água possa voltar aos rios e ao meio ambiente. Em países como o Brasil, onde existe um déficit de coleta e de tratamento, o esgoto não tratado por vezes volta aos mananciais. Poluindo rios e comprometendo a utilização da água. Um projeto da Poli-USP, em parceria com a Sabesp, prevê a concepção, projeto, implantação, operação e avaliação dos resultados de uma Epap (Estação Produtora de Água Purificada). Similar a estações de outros países, a Epap produzirá água com padrão de potabilidade, ou seja, água tratada própria para consumo.
Para além do reúso potável, é importante pensar em alternativas para a captação de água. Além do projeto de osmose reversa em implantação na cidade de Fortaleza, diversos hotéis da região Nordeste já utilizam esse processo para a captação e uso de água com origem no mar. Em outras regiões, empresas como a Aquapolo, Braskem e Ambev já utilizam do reúso em algumas de suas plantas industriais. Quando questionado sobre o que falta para que o reúso ganhe escala, Mierzwa salienta que, em geral, a indústria não está conectada às redes de companhia de abastecimento. Possui autorização para a retirada de águas de mananciais.
“Então ela acha que a água não tem preço, é barata”, completa.
O professor diz que, além disso, políticas que trazem uma precificação mais justa do uso da água são importantes para tornar o reúso mais atrativo para as empresas. De fato, em regiões com risco de escassez hídrica, as empresas veem no reúso uma defesa da sua capacidade produtiva. Por fim, um último ponto a salientar, para um incentivo real do reúso, é o estabelecimento de normas técnicas concretas. No entanto, com diferentes normas em cada Estado e sem um guia nacional, as iniciativas e padrões se tornam difusas ao longo do País.
“Do meu ponto de vista, que atuo na área do reúso, a gente tinha que ter uma maior colaboração dos órgãos de controle, principalmente pela Vigilância Sanitária e Ministério da Saúde. Muitas vezes eles alegam algumas informações por desconhecimento ou por insegurança e acaba que nós perdemos a oportunidade de contribuir para uma discussão ampla, de criar critérios específicos para expandir a prática do reúso, seja ela potável ou não potável”, completa Mierzwa.
Fonte: Jornal da USP